ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA E PROCEDIMENTO DE INTIMAÇÃO E CONSOLIDAÇÃO DA
PROPRIEDADE FIDUCIÁRIA (PASSO A PASSO)
1)Intimação por hora certa: Até aqui, só havia as modalidades de intimação pessoal
e por edital. Daqui em diante, se o devedor for procurado sem sucesso por duas
vezes, e se houver suspeita de ocultação, qualquer pessoa da família ou vizinho
poderá receber o aviso de que a intimação será feita no dia útil seguinte. (inclusão do § 3-A do art. 26)
2) Intimação por hora certa em locais de acesso controlado: Nos condomínios edilícios ou
outras espécies de conjuntos imobiliários com controle de acesso, a intimação
por hora certa poderá ser feita na pessoa do funcionário responsável pelo
recebimento de correspondência (inclusão do § 3-B do art. 26).
3) Prazo de averbação da consolidação da propriedade: Segundo a nova regra, aplicável
apenas aos casos de financiamento habitacional, incluindo operações do Minha
Casa Minha Vida, a consolidação da propriedade deverá ser averbada “trinta dias após a expiração do
prazo para purgação da mora”. Aqui, me parece, faltou mais clareza
ao legislador. Não se diga que a falta do “até”, antes de “trinta”, significa que a averbação
deve ser feita no trigésimo dia. Essa precisão não faz a menor lógica. Há mais.
Obviamente, o oficial do cartório de registro de imóveis, sem requerimento e
comprovação de quitação do imposto de transmissão (ITBI), não pode promover tal
averbação, sendo necessária a atuação do credor. Então, já há quem defenda que,
ultrapassado este prazo, o credor deverá promover nova intimação do devedor.
Ora, mas isso significaria atribuir um efeito jurídico que o dispositivo não
previu. O mais razoável, então, parece ser a interpretação conjunta com o § 2
do mesmo artigo 26-A, isto é: enquanto não promovida, pelo credor, a averbação
da consolidação da propriedade fiduciária, o devedor poderá purgar a mora. (inclusão do § 1 do art. 26-A)
4) Purga da mora até a averbação da consolidação: Como visto acima, enquanto a
propriedade não estiver consolidada em nome do credor, o devedor terá a chance
de purgar a mora e manter o contrato de alienação fiduciária. Sublinhe-se,
porém, que essa extensão de prazo só vale para os casos de financiamento
habitacional, incluindo operações do Minha Casa Minha Vida. Nas demais
hipóteses, o devedor deverá purgar a mora no prazo da intimação. (inclusão do § 2 do art. 26-A).
5) Comunicação ao devedor sobre os leilões: Até hoje discutia-se a necessidade
de intimar, ou não, o devedor acerca dos leilões. Agora, não há mais dúvida: as
datas, horários e locais dos leilões devem ser comunicados ao devedor, mediante
correspondência dirigida aos endereços constantes do contrato, inclusive ao
endereço eletrônico (inclusão do § 2-A do art. 27).
6) Direito de “preferência” do devedor: De acordo com a nova regra, ainda
que a propriedade já tenha sido consolidada (isto é, quando não for mais
possível purgar a mora), o devedor, até o 2º leilão, terá o “direito de preferência”
para adquirir o imóvel. Entretanto, a natureza jurídica desse direito não
parece ser de preferência, e sim de aquisição, pois o devedor não tem que
igualar proposta de terceiro. Ele deve, simplesmente (não que seja fácil!),
pagar o preço mínimo previsto no dispositivo legal: valor da dívida + ITBI e
laudêmio (este, se houver) pagos na consolidação da propriedade + despesas
inerentes ao procedimento de cobrança e leilão. Nem seria essencial, mas o
dispositivo, prudentemente, para evitar discussões, deixa claro que o ITBI e as
despesas (certidões, escritura e registro) dessa aquisição caberão ao devedor. (inclusão do § 2-B do art. 27).
7) Valor mínimo em 1° leilão: Antes, o preço mínimo de
arrematação deveria equivaler àquele estipulado no contrato de alienação
fiduciária, atualizado monetariamente. Agora, se a base de cálculo do imposto
de transmissão pago para a consolidação da propriedade for maior, este deverá
ser o preço mínimo de arrematação. Reduz-se, assim, o risco, em 1° leilão, de
alienação por valor em desalinho com o mercado então vigente. (inclusão do § único do art. 24
+ modificação do art. 27, §1)
8) Termo inicial da taxa de ocupação: Muitas vezes o 2º leilão é
negativo, e nesses casos sempre surgia a discussão: a partir de quando seria
devida a taxa de ocupação, já que a lei falava em “data da alienação em leilão”? Com a nova redação, a
taxa passa a ser devida desde a “data da consolidação da propriedade fiduciária”. Como
em direitos reais a propriedade só se transmite pelo registro, entenda-se esta
data como sendo a data de averbação da consolidação. (alteração do art. 37-A).
9) Discussões do contrato devem ser resolvidas por indenização: Uma vez averbada a consolidação da
propriedade fiduciária, as ações judiciais que tenham por objeto controvérsias
sobre as estipulações contratuais ou os requisitos procedimentais de cobrança e
leilão, excetuada a exigência de intimação do devedor, serão resolvidas em
perdas e danos, e não obstarão a reintegração na posse do imóvel. Esta regra
vale para todas as operações em que haja financiamento imobiliário,
habitacionais ou não (inclusão do § único do art. 30).
10) Inaplicabilidade do decreto-lei 70/66: A nova Lei estipula que os artigos 29 a
41 do Decreto-Lei nº 70/66 aplicam-se “exclusivamente aos procedimentos de execução de créditos
garantidos por hipoteca”, o que faz todo sentido, pois os
procedimentos ali previstos são incompatíveis com o regime da alienação
fiduciária. Entretanto, como o caput menciona
as “operações de financiamento
imobiliário em geral”, poderá haver a discussão sobre a aplicação
desse Decreto-Lei aos demais pactos de alienação fiduciária (alteração do inciso II do art.
39).
Em resumo: as alterações
3 e 4 só se aplicam aos contratos em que haja financiamento habitacional; as
modificações 9 e 10 (esta última, discutivelmente) valem para os negócios de
alienação fiduciária inseridos no âmbito do sistema de financiamento
imobiliário (habitacional ou não), e as demais (1, 2, 5, 6, 7 e 8) estendem-se
a todos os pactos de alienação fiduciária de bem imóvel.
O objetivo desse conjunto
de regras, criadas a partir da vivência dos problemas e discussões mais comuns
na execução fiduciária, é beneficiar os dois polos da relação, evitando abusos
de ambas as partes, e reduzindo incertezas.
Isso, por si só, será a
tábua de salvação do instituto? Claro que não. Ainda há, e sempre haverá, mais
a ser feito. Mas não duvidem: essas alterações são um importante passo para
tornar essa garantia real, que foi um dos propulsores do boom imobiliário
que o país viveu, num instrumento ainda mais eficaz, aumentando a segurança
jurídica, e, por conseguinte, viabilizando investimentos crescentes e melhor
acesso à aquisição de imóveis. O país, em crise, agradece.
Fonte: André Abelha é sócio do
escritório Castier/Abelha Advogados.
04/05/2020 » INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 99, DE 30 DE DEZEMBRO DE 2019 |
09/04/2020 » SANCIONADO COM VETOS TEXTOS DA MP DA RENEGOCIAÇÃO DAS DÍVIDAS AGRÍCOLAS |
08/04/2020 » LEI Nº 13.986, DE 07 DE ABRIL DE 2020 - AGRONEGÓCIO |