ITBI e ITCMD: incidência sobre partilha de bens em divórcio.
Na constância do casamento, ambos os cônjuges
possuem a propriedade total de todos os bens e o patrimônio de ambos é
considerado uma só universalidade, portanto não há incidência de qualquer
tributação sobre eventuais trocas de frações de determinados bens.
1. INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem como objetivo a análise
quanto à identificação da tributação incidente sobre a partilha de bens, nos
autos de uma ação de divórcio, em que os ex-cônjuges eram casados em regime de
comunhão total de bens. Objetiva ainda a identificação do sujeito ativo do
tributo a incidir, bem como sua respectiva base de cálculo.
2. DESENVOLVIMENTO
Primeiramente urge tecer algumas considerações
acerca do Imposto sobre a transmissão de bens imóveis e de direitos a eles
relativos – ITBI e do Imposto sobre a transmissão causa mortis e doação, de
quaisquer bens ou direitos – ITCMD.
Ao passo que o ITBI, previsto no art.156, II, da
CR/88, é um imposto de competência municipal incidente sobre a transmissão
onerosa de bens imóveis, por ato inter vivos, ou de direitos reais a eles
relativos, ressalvados os de garantia, o ITCMD é um imposto de competência
estadual incidente sobre a transmissão causa mortis ou doação de
quaisquer bens e direitos, previsto, por sua vez, no art. 155, I, da CR/88.
Tendo em vista a competência tributária municipal
do ITBI e estadual do ITCMD, somando-se ao fato de que não há qualquer lei
federal que institua normas gerais sobre esses impostos, tem-se que o presente
estudo irá resolver a questão proposta levando em conta os princípios gerais
das exações em comento e demais questões comuns relativas às mesmas, podendo a
solução de controvérsias acerca do tema ser um pouco diferente em casos
concretos, tudo a depender das regulamentações específicas promovidas pelos
entes competentes.
Analisando as características dos tributos, pode-se
perceber que tanto o ITBI quanto o ITCMD possuem em comum a transmissão como
fato gerador, sendo eles diferenciados no que se refere à forma de
transferência, se onerosa ou não.
Assim, deve-se a priori identificar
qual é a situação dos bens na constância do casamento e a situação desses após
a realização da partilha para a partir de então identificar de que forma
ocorreu a transmissão e, a seguir, a tributação a incidir.
Pois bem, há autores que entendem que no casamento
cada cônjuge possui apenas 50% (cinqüenta por cento) de cada bem integrante do
patrimônio do casal. Deste modo, na hipótese de o casal possuir dois imóveis e
de, ao final da partilha, cada cônjuge ficar com um deles, tem-se que cada um
passou a possuir 100% (cem por cento) de determinado bem imóvel. Diante disso,
afirmam que houve uma incorporação, decorrente de permuta, ao seu patrimônio
individual da metade ideal pertencente ao outro cônjuge.[01]
Segundo este entendimento “cada imóvel deve ser
considerado isoladamente”[02], havendo, desta forma, a incidência do
ITBI sobre as permutas ocorridas: troca de parte de um imóvel pela parte do
outro.
Para exemplificar a questão, suponhamos que o casal
possui o patrimônio comum no regime de comunhão universal correspondente a R$
300.000,00 (trezentos mil reais), dos quais R$ 150.000,00 (cento e cinqüenta
mil reais) concernem a um imóvel situado no Município X e R$ 150.000,00 (cento
e cinqüenta mil reais) a outro imóvel situado, por sua vez, no Município Y,
ambos no Estado Z. Após a partilha, cada um dos cônjuges ficará com um deles.
Segundo o entendimento acima esposado, haveria uma
incorporação ao patrimônio de cada um do valor correspondente a R$ 75.000,00
(setenta e cinco mil reais), sobre os quais incidiria ITBI tanto para
transmissão do imóvel localizado no Município X quanto para o localizado no
Município Y.
Contudo, há doutrinadores que possuem entendimento
segundo o qual durante o casamento, ambos os cônjuges possuem a propriedade
total de todos os bens, havendo a chamada mancomunhão (propriedade
em mão comum), onde o patrimônio de ambos é considerado uma só universalidade.[03]
Segundo este entendimento, que é majoritário e, na
nossa opinião, mais correto, ficando cada um dos cônjuges com um bem, não há
que se falar em permuta ou em qualquer ato de transmissão de patrimônio e,
consequentemente, em incidência de ITBI sobre eventuais trocas de frações de
determinados bens, uma vez que ambos os cônjuges são proprietários do mesmo
todo, que apenas foi individualizado por meio da partilha.
Ultrapassada a questão da meação, devemos adentrar
em outro aspec a desigualdade na partilha.
Neste caso, há sim uma transmissão de direitos, o
que pode ensejar tributação a depender da forma da transferência deste excesso,
se a título oneroso ou gratuito.
Sob este aspecto, praticamente não há divergência
na doutrina nem na jurisprudência pátria, tendo a questão inclusive sido
analisada pelo Egrégio Supremo Tribunal Federal em sua Súmula 116: “Em
desquite ou inventário, é legítima a cobrança do chamado imposto de reposição,
quando houver desigualdade nos valores partilhados.”
Assim, como dito, há que ser analisada sob que
condição houve a adjudicação da parte que supera a meação. Se houve alguma
forma de compensação por parte do cônjuge que recebeu o bem de valor superior,
tem-se que a transmissão ocorreu de forma onerosa, devendo incidir o ITBI sobre
o excesso da meação. No caso do excesso ter sido transferido por mera
liberalidade do outro cônjuge, entende-se que houve uma doação, devendo assim
incidir o ITCMD.
Neste sentido já se pronunciou o Egrégio Superior
Tribunal de Justiça quando do julgamento do Recurso Especial nº 723587/RJ, Rel.
Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 05/05/2005, DJ 06/06/2005, p.
300.
Para entendermos melhor, damos como exemplo o caso
já explicitado, contudo considerando que o patrimônio comum no regime de
comunhão universal correspondente a R$ 300.000,00 (trezentos mil reais) é
dividido em dois imóveis dos quais R$ 160.000,00 (cento e sessenta mil reais)
concernem ao imóvel situado no Município X e R$ 140.000,00 (cento e quarenta
mil reais) ao outro imóvel situado no Município Y, ambos no Estado Z. Após a
partilha, cada um dos cônjuges ficará com um deles, sendo o de maior valor
designado à ex-esposa.
Neste caso, de acordo com o segundo entendimento,
tem-se que como o valor da meação corresponde a R$ 150.000,00 (cento e
cinqüenta mil reais) e a ex-esposa ficou com o imóvel cujo valor é avaliado em
R$ 160.000,00 (cento e sessenta mil reais), deveria incidir tributação sobre o
excesso da meação, qual seja, sobre R$ 10.000,00 (dez mil reais).
Na hipótese de ter havido contraprestação quando do
recebimento do valor que supera a meação, o tributo a incidir seria o ITBI a
ser pago ao Município X, onde está localizado o imóvel de maior valor.
Doutro turno, no caso de ausência de compensação
para o recebimento do excesso, entende-se que houve doação deste, de modo a
incidir ITCMD sobre o referido valor, a ser pago ao Estado Z.
3. CONCLUSÃO
Diante dessas considerações, e adotando o
posicionamento segundo o qual na constância do casamento ambos os cônjuges
possuem a propriedade total de todos os bens, onde o patrimônio de ambos é
considerado uma só universalidade, conclui-se que não há que se falar em
incidência de qualquer tributação sobre eventuais trocas de frações de
determinados bens.
Por outro lado, no caso de partilha desigual,
deve-se analisar sob que condições ocorreu a transmissão do valor
correspondente ao excesso da meação, se a título oneroso ou gratuito, a fim de
identificar se incidirá ITBI ou ITCMD sobre o referido excesso e, consequentemente,
quem será o sujeito ativo, o Município ou o Estado onde está localizado o bem
de maior valor.
4. Referências Bibliográficas
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estaduais e municipais. 5. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009.
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das
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MELO, José Eduardo Soares de et al. Impostos.
Federais, estaduais e municipais. 5. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado,
2009.
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Navigandi, Teresina, ano 15, n. 2451, 18 mar. 2010. Disponível
em:
MELO, Omar Augusto Leite. ITBI x ITCMD na
dissolução de condomínio e na divisão de bens “causa mortis” ou no divórcio.
Tributação na Construção Civil. 26 jan. 2011. Disponível em: http://www.tributacaonaconstrucao.com.br/index.php/artigos.html.
Acesso: 11 jul. 2011.
Notas
Autor
Iana Gonçalves Souto Maior Vieira
Procuradora da Fazenda Nacional. Especialista em em
Direito Judiciário e Magistratura do Trabalho pela Esmatra da 6a Região.
Pós-Graduanda em Direito Tributário pela UNIDERP.
NBR 6023:2002 ABNT: VIEIRA, Iana Gonçalves Souto
Maior. ITBI e ITCMD: incidência sobre partilha de bens em divórcio. Jus
Navigandi, Teresina, ano 16, n. 3009, 27 set. 2011. Disponível em:
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